Acredita-se no amor eterno já que os hormônios não cabem nas roupas minúsculas que cobrem pelos arrepiados por borboletas na barriga. Umidade, cerveja barata, indie rock, sutiã de bojo, decotes e olhares igualmente generosos.

A criatividade conta mentiras desesperadas para fugir da realidade padrão, tão clichê. Pisamos em temas encantadores que escondem fiapos em busca de aceitação. Conversas intermináveis perpetuam nosso vitalício “eu te amo”, conveniente e perecível como a candura da idade. A fantasia de estar no palco, cantar como se a plateia preenchesse o buraco negro de espinhas. Fazemos o trauma dançar pelos ombros, o rancor descer pelas vértebras, deixamos o suor sair junto com tanta culpa mascarada. A sede de pertencer e ser consumida por aquela alegria infantil que antecede o pulo na piscina. Corpos dançantes de projeções dos pais, dos amigos, dos amigos dos amigos…

Continuo nos sonhos dessa pessoa que segue me idealizando daquela forma que se encaixa na caixa de tudo que nunca serei. Aquelas conversas profundas e igualmente excitantes sobre o que somos, o que queremos ser e o tanto que não temos mais compatibilidade. Mas a química ainda pulsa delirante, e antes que eu acorde, essa é a minha última chance de viver tudo aquilo que evitamos por orgulho. Um orgulho com gosto de rum. Cuba libre.

Que ressaca terrível viver esse depois cheio de arrependimentos. Ligamos uns para os outros como quem se lembra de um detalhe surpreendente: a arma de Tchekhov. Que delícia se lembrar de pormenores, que conforto andar de meias brancas e limpar o receio de tudo terminar amanhã, como se fôssemos o canto dos passarinhos no amanhecer, tão vivos e irritantes.

Aproveitamos aquele tempo? Escondo todas as feridas no palco da vida como quem clama por ser reconhecida. Ganho palmas por disfarçar meus desejos, afogo a nostalgia de um dia já ter mergulhado nos cabelos castanhos e ondulados de Maria. Daqui sinto o perfume amadeirado com notas de âmbar e lembro que ela sorria com os olhos antes de me encontrar no banheiro sujo do bar.

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